quarta-feira, 21 de outubro de 2009

Revolução Chinesa - 60 anos



Socialismo à chinesa sobrevive ao século 20


Mao anuncia a fundação da República Popular da China, em 1º de outubro de 1949
Há 60 anos, no dia 1º de outubro de 1949, a Revolução Chinesa transformou o terceiro maior país do planeta - e o mais populoso - numa nação socialista, a República Popular da China. Direto ao ponto: Ficha-resumo)

Seria impensável, à época, unir economia liberal, baseada no mercado livre, e regime comunista, centralizado no Estado. Pois é com esse modelo administrativo que a China, depois de passar metade do século 20 em conflitos e sobreviver ao colapso do comunismo, ao final da Guerra Fria (1945-1991), ameaça hoje a hegemonia dos Estados Unidos.

Senhores feudais
Considerada um dos berços da civilização, a China desenvolveu a escrita, o Estado e várias tecnologias - como a fundição de ferro e bronze, fabricação de tecidos, indústria naval e imprensa - muito antes do Ocidente.

Enquanto os gregos inventavam a filosofia ocidental e a democracia, entre os séculos 8 e 3 a.C. os chineses faziam a transição da sociedade escravista para o regime feudal, com amplo desenvolvimento cultural e científico.

Foi também um período marcado por guerras entre os senhores feudais, até que a dinastia Qin instituiu o primeiro Estado centralizador, com o objetivo de unificar o país e resolver os conflitos internos. Os dois mais famosos legados da China feudal são da dinastia Qin: a Grande Muralha e o Exército de Terracota.

Nos séculos seguintes, a disputa entre dinastias ora centralizava ora descentralizava o poder no Estado chinês.

Durante a dinastia Ming (1368-1644), no século 14, o país possuía a mais avançada frota naval do mundo. Porém, a expansão mercantilista foi proibida pelo sistema feudal, influenciado por aspectos mais conservadores da doutrina de Confúcio (551 a.C.- 479 a.C.). Isso contribuiu para a ascensão da monarquia absolutista Qing e o atraso econômico, social e industrial da China em relação à Europa.

Foram essas desvantagens frente aos impérios coloniais do século 19, somadas a instabilidades internas causadas por rebeliões camponesas, que deixaram o país suscetível a interferências de nações imperialistas. Após a primeira Guerra do Ópio (1840), contra a Inglaterra, o país foi praticamente retalhado em colônias inglesas, francesas, alemãs, japonesas e americanas.

Revoltas camponesas
O clima de revolta contra os estrangeiros e os senhores feudais incentivou levantes populares como a Revolução Celestial Taiping (1851-1864) e as rebeliões dos Nain (1851) e dos Boxers (1900-1901). O sentimento anticolonialista entre os camponeses - que, correspondendo a 80% da população, eram a grande força militar do país - foi canalizado na formação do Kuomintang (Partido Nacionalista Chinês). O partido foi criado por Sun Yat-sen (1866-1925), que proclamou a República entre 1911 e 1912.

Mas mesmo tendo derrotado a monarquia feudal, os nacionalistas não conseguiram manter o poder, que foi transferido para senhores da guerra ligados às potências estrangeiras. Na prática, portanto, pouca coisa mudou.

Na Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a China se aliou à Inglaterra e à França contra a Alemanha e o Japão, esperando com isso rever sua condição de dependência colonial. Contudo, mesmo apoiando os vencedores, a China teve de aceitar, ao final da guerra, o artigo do Tratado de Versalhes (1919) que conferiu ao Japão o direito de posse das concessões alemãs em território chinês.

Revoltados contra o fracasso da diplomacia do governo chinês, estudantes promoveram manifestações em Pequim que se espalharam pelo país, conhecidas como Movimento 4 de Maio. Os jovens também criaram, sob influência da Revolução Russa de 1917, o Partido Comunista Chinês (PCC), em 1921.

No início, o PCC e o Kuomintang eram aliados contra os senhores da guerra e as potências colonialistas. Isso mudou com um golpe militar, em 1927, do sucessor de Sun Yat-sen na liderança do Partido Nacionalista, Chiang Kai-shek (1887-1975). Os comunistas se refugiaram no campo, onde organizaram a luta armada e o Exército Vermelho para combater os nacionalistas. O PCC estabeleceu ali um modelo de guerrilha rural seguido, por exemplo, pelos comunistas brasileiros na Guerrilha do Araguaia (1972-1975).

A guerra civil entre nacionalistas e comunistas se estendeu até 1935, com a vitória do Kuomintang e a perda de 90% do efetivo do exército comunista durante a Grande Marcha.

Na Segunda Guerra Mundial (1939-1945), os partidos se uniram mais uma vez contra a ocupação japonesa e, em 1947, travaram nova guerra civil. Desta vez, os comunistas tinham mais prestígio junto ao povo, graças à resistência às tropas nipônicas, além de apoio da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Sob a liderança de Mao Tse-tung (1893-1976), o PCC derrotou o Partido Nacionalista e proclamou, em 1949, a República Popular da China.

Revolução Cultural
A China era então um país pobre, atrasado e completamente destruído por mais de duas décadas de guerras e batalhas domésticas. Nas três décadas seguintes, Mao Tse-tung fez do país um dos maiores laboratórios da experiência socialista do século passado, grande também em seus desastres.

No decorrer do Grande Salto Adiante (1958-1961), campanha que tinha como objetivo modernizar a China aumentando a produção agrícola e acelerando a industrialização, cerca de 20 milhões de pessoas morreram de fome.

Já a Revolução Cultural (1966-1967, 1972-1973 e 1975-1977), movimento de caráter ideológico que iniciou o culto ao líder Mao Tse-tung, foi um dos períodos mais traumáticos da história do país. Intelectuais e pessoas consideradas inimigas do partido eram executadas pelos "guardas vermelhos", enquanto outros eram perseguidos e exilados do país.

Foram estes primeiros fracassos do regime comunista que levaram o PCC - tendo à frente Deng Xiaoping (1904-1997), que se tornou líder máximo após a morte de Mao - a promover reformas políticas e econômicas entre 1978 e 1980. As reformas tiveram como maior característica a abertura do mercado.

Com a queda dos governos comunistas no Leste Europeu, supunha-se que a China encontraria o mesmo caminho aberto pelas reformas na economia, rumo à democracia liberal. Não foi o que aconteceu. O país adotou um sistema que combina protecionismo e livre mercado, propriedade privada e social, capitalismo econômico e Estado socialista.

China pós-crise
Hoje a China é a terceira maior economia do planeta, atrás somente dos Estados Unidos e do Japão, ultrapassando o Reino Unido e a Alemanha. Além disso, é país que mais concentra investimentos estrangeiros. No atual ritmo de crescimento, deve se tornar, em 2010, a segunda maior potência econômica, ameaçando a supremacia dos americanos.

Desde 1991, a economia cresceu quase 11 vezes, tornando a capital, Pequim, uma das metrópoles mais arrojadas e modernas do planeta. O país, que foi também um dos primeiros a se recuperar da crise econômica mundial, assumiu a liderança no mercado automobilístico e superou a Alemanha como maior exportador mundial.

O sucesso na área econômica, no entanto, foi acompanhado de censura à imprensa, restrições aos direitos civis e violações dos direitos humanos. Eventos dramáticos, como o massacre da Paz Celestial (Tiananmen), anexação do Tibete e o massacre da etnia uigur na Província de Xinjiang, no ano passado, renderam críticas da comunidade internacional.

No desfile militar que irá comemorar os 60 anos da Revolução Chinesa, o mesmo povo que colocou no poder os comunistas será barrado por um forte esquema de segurança na capital chinesa. Sinal de que uma das nações mais poderosas do século 21 é também uma aberração política do século 20, sem contradição.

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